TELETRABALHO ou HOME OFFICE

O home office nasceu nos Estados Unidos e logo tomou conta do mundo. Nada mais compreensível, afinal, as mudanças na tecnologia viabilizam essa forma de prestação de serviço. Lá, no país das oportunidades, um dos países mais ricos do mundo, e de sistema tributário e trabalhista muito diferentes dos nossos, cerca de 89% das empresas já possuem estrutura para implantação desse sistema de trabalho, segundo informações da World at Work, em 2017.
Mas o que nos interessa mesmo, é como as coisas funcionam aqui, após a Reforma Trabalhista de 2017, que incorporou o teletrabalho como prestação de serviço regulamentado pela CLT. Apenas lembrando que, a lei 13.467/17 que implantou a Reforma, já sofreu alteração através de Medida Provisória, mas o teletrabalho não sofreu qualquer alteração no texto da lei até o momento, todavia, existe pressão por parte do Ministério Público do Trabalho, e de outros segmentos da área trabalhista, para que haja uma regulamentação mais pormenorizada sobre os artigos 75 A – 75 E da CLT, para evitar lesões aos direitos do empregado.
Enfim, é evidente que agora com a regulamentação, o teletrabalho será muito utilizado no Brasil, e segundo um estudo realizado pela SAP Consultoria, a previsão é de que cresça cerca de 15% ao ano no país. Isso, tendo em vista o fato de que a empresa terá menos despesas com transportes, com espaço físico, e o empregado, menos desgaste na locomoção até o trabalho, dentre outras vantagens.
Mas nem tudo são flores, as empresas terão que se adaptar, como por exemplo,  investir em equipamentos e em sistemas de segurança que impeçam os ataques virtuais que possam roubar informações e segredos da empresa.
Até que o Brasil estabeleça mecanismos práticos de utilização desse novo sistema de trabalho, e uma nova cultura seja formada, vamos analisar no momento o home office sob a luz da CLT, e de maneira simples, informar aos interessados no assunto, como está atualmente a legislação trabalhista sobre o tema.

O QUE É TELETRABALHO / HOME OFFICE? O artigo 75 B da CLT, diz que “considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.” Primeiramente, a lei diz que é uma prestação de serviço realizada “preponderantemente” fora das dependências do empregador,  isso vale dizer, que o empregado pode vir também a trabalhar nas dependências da empregadora, e não somente em casa, ou em outro local, sem que desconfigure o teletrabalho. A segunda característica é a utilização de tenologia de informação e comunicação, por isso, o legislador utilizou a expressão “tele”. Assim, caso o trabalho não conte com estes elementos, estaremos diante de outra forma de prestação de serviço, mas não o teletrabalho. Portanto, não é qualquer trabalho externo às dependências da empresa que tipifica o home office, mas para que seja assim considerado, deve haver: trabalho preponderantemente fora das dependências do empregador, aliado à utilização de tecnologias de informação e de comunicação. O parágrafo único reforça o entendimento quando afirma que “o comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho.”

É POSSÍVEL ALTERAÇÃO DO REGIME DE TELETRABALHO PARA O PRESENCIAL E VICE-VERSA? Sim, é possível desde que haja acordo mútuo entre empregado e empregador, registrado em aditivo contratual. E também, deve haver um prazo mínimo para essa transição, que é de 15 dias.

CONTRATO DE TRABALHO – UM IMPORTANTE ELEMENTO: Há de se observar que acima consta o termo “aditivo contratual”. Isso porque, o teletrabalho deve constar de contrato escrito entre empregado e empregador, além de fazer constar também, na Carteira de Trabalho. É necessário chamar a atenção para esse elemento importante que é o contrato, principalmente, nesse primeiro momento do teletrabalho no país (embora ser prudente prestar atenção em qualquer contrato!). Na verdade, abrindo aqui mais um parênteses, a Reforma Trabalhista trouxe mudanças drásticas nas relações de emprego, tornando prudente ler e compreender claramente o que dizem os contratos de trabalho daqui em diante, e não mais assiná-los automaticamente, como se fazia antes, e na dúvida, procurar um advogado da área trabalhista. Mas voltando ao assunto do Contrato do teletrabalho, os artigos que foram inseridos na CLT sobre ele, estão cheios do termo “contrato”, deixando claro que este instrumento determinará certas regras, como por exemplo quando diz, “as disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto, bem como ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado, serão previstas em contrato escrito.” Olha só que importância tem isso! Pela literalidade da lei, poderá o empregado arcar com a aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos, caso isso fique estabelecido no contrato. E veja também, que é no contrato que ficará estabelecido o reembolso de despesas, como energia elétrica, gastos com impressão de documentos, despesas com telefonia. Apesar de não querer levar o assunto para uma outra vertente de discussão, é necessário lembrar que os princípios trabalhistas permanecem, e o ônus do empreendimento é do empregador e não do empregado, segundo o Princípio da Alteridade. Isso é extremamente importante e tem que ser levado em consideração no momento do pacto.
Outro ponto importante, que o legislador nem se quer pensou, mas que na prática poderá ocorrer, é quanto as informações relativas à empresa, seu sigilo. Este é um problema que existe também quando o trabalho é realizado nas dependências da empresa, todavia, neste caso, existe o “olhar do dono”, e a segurança de seus equipamentos estão sob sua responsabilidade, além de já existir toda uma tradição empresarial e jurídica para tratar do assunto. Com o teletrabalho, isso tudo é ainda muito novo, e portanto, fazer um contrato bem feito, pode evitar dissabores. Todavia, atenção ao que consta ao final dessa matéria, sobre a constitucionalização do direito.

E OS ACIDENTES DE TRABALHO COMO FICAM? Segundo o artigo 75 E, “o empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho.” E no seu parágrafo único, consta:  “o empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.” Como diz o ditado popular “choveu no molhado” o legislador, e nesse ponto, segue-se as normas gerais sobre segurança e acidente de trabalho, seja no âmbito trabalhista ou previdenciário, pois permanece com o empregador a obrigação de fornecer equipamentos de saúde e segurança, que é norma de ordem pública, e continua cabendo ao empregado utilizar de forma correta esses equipamentos.

JORNADA DE TRABALHO, DESCANSO E HORA EXTRA:  Aqui surge uma questão que se encontra no inciso III do artigo 62 da CLT, que diz que a jornada de trabalho não é aplicável ao empregado sob o regime de teletrabalho. Portanto, se assim for, o empregado não estará sujeito a controle de ponto, advertência, descontos, nem receberá horas extras. Esse é um dos pontos relevantes do teletrabalho que tem sido combatido pelo Ministério Público do Trabalho, e com certeza, caso não haja alteração legal, vai parar no Judiciário. Isso porque, na forma do artigo 62, III CLT, o empregado estará na realidade passível de sofrer abusos, cumprindo jornadas superiores a estabelecida em lei. Por outro lado, existem mecanismos de controle à distância que podem ser usados pelo empregador para que o empregado cumpra legalmente a jornada de trabalho, lembrando que a obrigação do controle permanece com o empregador, diante do seu poder diretivo e a subordinação jurídica do empregado.
No mais, os demais direitos e obrigações trabalhistas permanecem iguais, como férias, décimo-terceiro, aviso prévio, licença maternidade e paternidade, etc.


CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO: Esse tema poderá ser matéria de outra publicação com mais detalhes, pois o assunto é extremamente interessante e importante, mas no momento, é necessário deixar claro que, não somente diante do teletrabalho, mas sobre qualquer outro assunto trabalhista, ou mesmo de outro ramo do Direito, as normas (sentido amplo) devem obediência à Constituição Federal, seja respeitando suas disposições sobre Direitos e Garantias Fundamentais, seja respeitando o legítimo processo legislativo, ou na aplicação prática da lei que deságua nos profissionais do Direito, no Judiciário, e nas relações cotidianas. Nenhum direito do empregado ou empregador pode ser suprimido ou alterado, sem o devido processo legislativo, sem que o Judiciário cerque as partes com as garantias do devido processo legal e ampla defesa, sem que as instituições criadas para zelar pelos interesses de patrões e empregados desempenhem suas funções constitucionais e legais para as quais foram criadas. O Direito é um emaranhado de normas, mas não é uma bagunça. Cada norma tem o seu lugar, e o lugar de todas elas é sob a égide da Constituição. Portanto, como esse blog tem o objetivo de procurar ajudar quem entre para lê-lo, e descomplicar o Direito, caso alguém tenha dúvidas ao firmar um contrato de trabalho sob a forma de teletrabalho, ou sobre qualquer outro assunto, procure um advogado trabalhista, e nunca esquecer que a Lei Maior é a Constituição Federal, e que nenhuma lei ou contrato abaixo dela pode prevalecer sobre sobre a mesma.

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