Peter Drucker

'A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo'. Peter F. Drucker
 Peter Ferdinand Drucker, nasceu em 19 de novembro de 1909 e faleceu em 11 de novembro de 2005.
O mais influente e importante estudioso de gestão do mundo. Uma lenda internacional, um ícone dos negócios. Considerado o pai da administração moderna. O guru da gestão das organizações.



A NOVA SOCIEDADE DE ORGANIZAÇÕES

O conhecimento é o principal recurso para os indivíduos e para a economia em geral. Terra, mão-de-obra e capital – os tradicionais fatores de produção dos economistas – não desaparecem, mas tornam-se secundários. Eles podem ser obtidos, e com facilidade, desde que haja conhecimento especializado. Ao mesmo tempo o conhecimento especializado por si só não produz nada. Ele se torna produtivo somente quando está integrado a uma tarefa. E é por isso que a sociedade do conhecimento também é uma sociedade de organizações: a finalidade e a função de cada organização, empresarial ou não, são a integração de conhecimentos especializados numa tarefa comum.

Sociedade, comunidade e família são instituições conservadoras. Elas procuram manter a estabilidade e evitar, ou pelo menos desacelerar, as mudanças. Mas a organização moderna é desestabilizadora. Ela precisa ser organizada para inovação e a inovação é "destruição criativa" (Josepf Schumpeter). E ela precisa estar organizada para o abandono sistemático de tudo aquilo que é estabelecido, costumeiro, conhecido e confortável, quer se trate de um produto, um serviço ou um processo, um conjunto de aptidões, relações humanas e sociais ou a própria organização. Em resumo, ela precisa ser organizada para as mudanças constantes. A função da organização é colocar o conhecimento para trabalhar em ferramentas, produtos e processos, na concepção do trabalho, no próprio conhecimento e que, por natureza, muda rapidamente e as certezas de hoje sempre se tornam os absurdos de amanhã.

Para os gerentes, as dinâmicas do conhecimento implicam num imperativo claro: cada organização precisa embutir o gerenciamento das mudanças em sua própria estrutura. Por um lado, isto significa que cada organização tem de se preparar para o abandono de tudo aquilo que faz. Os gerentes devem aprender a fazer, a cada dois ou três anos, a seguinte pergunta a respeito de cada processo, produto, procedimento e política: "Se já não fizéssemos isto, será que começaríamos a fazer agora, sabendo aquilo que sabemos?". Se a resposta for não, a organização deverá perguntar: "Então o que faremos agora?". E ela tem de fazer algo, e não dizer: "Vamos fazer outro estudo". Cada vez mais as organizações terão de planejar o abandono, ao invés de tentar prolongar a vida de um produto, política ou prática de sucesso.

Por outro lado, cada organização deve se dedicar à criação do novo. Em termos específicos, sua direção tem que adotar três práticas sistemáticas: (1) aperfeiçoamento contínuo de tudo aquilo que a organização faz, o processo que os japoneses chamam de kaizen; (2) aprender a explorar seus conhecimentos, isto é, a desenvolver a próxima geração de aplicações a partir de seus próprios sucessos; e (3) aprender a inovar - e agora a inovação pode e deve ser organizada – um processo sistemático. Tudo isso significa que as organizações da sociedade pós-capitalista precisam constantemente perturbar, desorganizar e desestabilizar a comunidade.

Um outro fato da vida organizacional produz igualmente rupturas: a organização moderna precisa estar numa comunidade, mas não poder ser dela. Sua "cultura" deve transcender a comunidade. É a natureza da tarefa, não a comunidade na qual esta é executada, que determina a cultura de uma organização. Para executar sua tarefa, a organização precisa ser organizada e administrada da mesma maneira que as outras do mesmo tipo.

A questão da responsabilidade social também é inerente à sociedade de organizações. A organização moderna tem, e precisa ter, poder social – e muito. Ela necessita de poder para tomar decisões a respeito de pessoas: quem contratar, quem demitir, quem promover. Ela necessita de poder para estabelecer as regras e disciplinas exigidas para produzir resultados: por exemplo, a atribuição de cargos e tarefas e a fixação dos horários de trabalho. Ela necessita de poder para decidir que fábricas construir, onde e quais fechar. Ela necessita de poder para fixar preços, e assim por diante.

Toda organização deve assumir plena responsabilidade pelo seu impacto sobre os funcionários, o meio ambiente, seus clientes e tudo e todos a quem tocar. Esta é sua responsabilidade social. Mas também sabemos que, cada vez mais, a sociedade irá querer que as grandes organizações, com ou sem fins lucrativos, solucionem os principais males sociais. E a esse respeito devemos estar atentos, porque boas intenções nem sempre são socialmente responsáveis. É irresponsável uma organização aceitar – para não falar em buscar – responsabilidades que a impeçam de desempenhar sua tarefa e missão principais ou a levem a atuar em áreas nas quais ela não tem competência.

Outras características da organização moderna:

- Como essa organização é composta por especialistas, cada um com sua área de conhecimento, sua missão precisa ser absolutamente clara. Ela tem que ser determinada, caso contrário seus membros ficarão confusos e seguirão cada um sua própria especialidade, ao invés de aplicá-la à tarefa comum. Somente uma missão focalizada e comum poderá mantê-la unida e capaz de produzir.

- A melhor definição de funcionários na sociedade pós-capitalista: são pessoas cuja capacidade de fazer uma contribuição depende delas terem acesso a uma organização.

- A organização precisa conquistar a lealdade provando aos seus funcionários de conhecimento que ela lhes oferece oportunidades excepcionais para colocar seus conhecimentos para trabalhar. A empresa não mais obtém a lealdade por dinheiro.

- Como ela consiste de especialistas de conhecimento, essa organização precisa de iguais, de colegas e associados. Nenhum conhecimento vale mais que outro; cada um é julgado por sua contribuição para a tarefa comum, ao invés de por qualquer superioridade ou inferioridade inerente. Portanto, ela não pode ser uma organização de chefe e subordinado. Ela deve ser organizada como uma equipe.

Mesmo assim, uma organização precisa ser gerenciada. O gerenciamento pode ser intermitente e superficial como é, por exemplo, na Associação de Pais e Mestres de uma escola americana de subúrbio. Ou ele pode ser uma tarefa absorvente e de tempo integral para um grupo relativamente grande de pessoas, como no caso dos militares, da empresa, do sindicato trabalhista e da universidade. Mas é preciso haver pessoas que tomem decisões, ou nada será realizado. É preciso haver pessoas responsáveis pela missão da organização, por seu espírito, seu desempenho, seus resultados. A sociedade, a comunidade e a família podem ter "líderes", mas somente as organizações conhecem uma "gerência". E embora esta possa possuir autoridade considerável, sua tarefa na organização moderna não é comandar. É inspirar.



GRANDE PODER DE PEQUENAS IDÉIAS

O futuro não pode ser conhecido. A única coisa certa a respeito dele é que será diferente de hoje, ao invés de uma continuação. Mas o futuro ainda não nasceu, nem está formado e é indeterminado. Ele pode ser moldado por ações intencionais. E a única coisa que pode efetivamente motivar essas ações é uma idéia – de uma economia diferente, uma tecnologia diferente ou um mercado diferente, explorado por uma empresa diferente. Mas as idéias sempre começam pequenas. É por isso que o planejamento a longo prazo não serve apenas para a grande empresa. É por isso que a pequena empresa pode de fato ter uma vantagem em tentar dar forma ao futuro hoje. O novo, o diferente, quando julgado em dólares, sempre parece tão pequeno e insignificante que tende a ser apequenado pelo simples volume dos negócios existentes na grande empresa. Contudo, o novo requer muito tempo. Tanto que a pequena empresa com freqüência está muito disposta a enfrentar a tarefa. É por isso que há bons motivos para a grande empresa organizar um esforço especial de planejamento a longo prazo; caso contrário, ela não conseguirá passar do trabalho de hoje.


Mas é claro que a pequena empresa que fizer um bom trabalho de moldar o futuro hoje não permanecerá "pequena" por muito tempo. Toda emprega grande e bem-sucedida hoje existente foi – em muitos casos até recentemente, como no caso da IBM ou da Xerox – um pequeno negócio baseado numa idéia de como deveria ser o futuro. Entretanto, essa "idéia" precisa ser empreendedora – com potencial e capacidade para produzir riqueza – expressa num negócio que produz e eficaz através de ações e comportamento. Subjacente à idéia empreendedora está sempre a pergunta: "Que grande mudança na economia, no mercado ou em conhecimento possibilitaria que nossa empresa conduzisse os negócios da maneira que realmente gostaríamos, com os melhores resultados econômicos?". A pergunta dominante não deve ser: "Como será a futura sociedade?". Esta é a pergunta do reformador social, do revolucionário ou do filósofo – não do empreendedor.

Fazer o futuro acontecer requer trabalho e não "genialidade". O homem com imaginação criativa terá, certamente, mais idéias imaginativas. Mas se estas irão ter mais sucesso é incerto. A criatividade, tão presente em discussões atuais sobre inovação, não é o verdadeiro problema. Normalmente há nas organizações mais idéias do que elas poderiam pôr em prática. O que falta é a disposição, por parte dos dirigentes, pare receber bem as idéias – eles deveriam solicitá-las, assim como fazem por produtos e processos. Mas sempre é preciso haver a disposição para pensar em termos gerais ao invés de específicos, em termos de um negócio, das contribuições que ele faz, da satisfação que proporciona, do mercado e da economia por ele servidos. Este é o ponto de vista empreendedor. E ele é acessível ao homem de negócios médio.

O gerente também precisa ter a coragem para comprometer recursos – e, em particular, pessoal de primeira classe – para trabalhar para fazer o futuro acontecer. O pessoal necessário para este trabalho deve ser pequeno, mas constituído pelos melhores elementos disponíveis; caso contrário, nada acontecerá. O homem de negócios necessita de uma base de validade e praticabilidade para idéias empreendedoras que fazem o futuro. Uma idéia precisa passar por testes rigorosos de praticabilidade para conseguir tornar um negócio bem-sucedido no futuro. Em primeiro lugar, ela deve ter validade operacional. Podemos agir com base nesta idéia? Ou podemos apenas falar a seu respeito? Podemos realmente fazer algo imediatamente para provocar o tipo de futuro que desejamos? Por outro lado, a idéia também precisa: 
(1) ter validade econômica, ou seja, se pudesse ser posta para funcionar imediatamente, ela teria de ser capaz de produzir resultados econômicos; 
(2) passar no teste do empenho pessoal – acreditamos realmente na idéia? Queremos realmente ser esse tipo de pessoa, fazer esse tipo de trabalho, dirigir esse tipo de negócio?
Fazer o futuro requer coragem. Requer trabalho, mas também requer fé. Comprometer-se com o oportuno simplesmente não é prático. Não será suficiente para os esforços que estão à frente. Porque nenhuma idéia é perfeitamente segura – nem deve ser.
Não ousando assumir o risco de fazer com que o novo aconteça, a gerência assume, por omissão, o risco maio de ser surpreendida pelo que irá acontecer. Este é um risco que nem mesmo a empresa maior e mais rica pode se dar ao luxo de assumir. E é um risco que nem mesmo a menor da empresas precisa assumir.



COMO TOMAR DECISÕES SOBRE PESSOAS
Os executivos passam muito tempo tomando decisões sobre pessoas do que com qualquer outra coisa – e devem fazê-lo. Nenhum outro tipo de decisão é tão durável em suas conseqüências ou tão difícil de desfazer. Contudo, os executivos, em sua maioria, tomam más decisões a respeito de pessoal. Não existe um juiz infalível de pessoas. Existem, porém, alguns executivos que levam a sério as decisões sobre pessoal e trabalham neles. Marshal e Sloan eram tão diferentes quanto podem ser dois seres humanos, mas seguiram – conscientemente – mais ou menos os mesmos princípios para tomar decisões sobre pessoas:

  • Se coloco uma pessoa em um cargo e ela não se desempenha bem, cometi um erro. Não posso culpar a pessoa, nem invocar o "princípio de Peter", nem reclamar. Cometi um erro.
  • É dever dos gerentes assegurarem o bom desempenho das pessoas responsáveis em suas organizações.
  • É melhor tomar bem as decisões sobre pessoas, porque elas determinam a capacidade de desempenho da organização.
  • A única coisa que não se deve fazer: não entregue a pessoas novas, novas e grandes atribuições, pois isso só aumenta os riscos. Dê atribuições deste tipo a alguém cujo comportamento e cujos hábitos sejam seus conhecidos e que tenha conquistado confiança e credibilidade dentro da sua organização. Coloque um recém-chegado de alto nível inicialmente numa posição estabelecida na qual as expectativas são conhecidas e o auxilio disponível.

As etapas da decisão – Assim como há somente poucos princípios básicos, também há poucas etapas importantes para seguir na tomada de decisões eficazes a respeito de pessoal:

  • Defina a atribuição
  • Analise um certo número de pessoas potencialmente qualificada
  • Pense bem a respeito de como analisar esses candidatos
  • Discuta cada um dos candidatos com várias pessoas que tenham trabalhado com eles
  • Certifique-se de que a pessoa nomeada entenda o cargo.

Mesmo que os executivos cumpram todas essas etapas, algumas das suas decisões sobre pessoas ainda irão falhar. Estas são, na maior parte dos casos, as decisões de alto risco que, não obstante, precisam ser tomadas. Não sabemos como testar ou prever se o temperamento de uma pessoa irá se adequar a um novo ambiente. Só podemos descobrir com a experiência. Se a passagem de um tipo de trabalho para outro não for bem sucedida, o executivo que tomou a decisão precisa transferir depressa o desajustado. Manter pessoas em um trabalho que elas não conseguem realizar não é bondade; é crueldade. Mas também não é motivo para deixá-las ir embora. Tomar decisões certas sobre pessoas é o meio básico de se controlar bem a organização. Essas decisões revelam o quanto a gerência é competente, quais são seus valores e se ela leva a sério suas funções. Não importa o quanto os gerentes procurem manter secretas suas decisões – e alguns ainda se esforçam para isso – as decisões sobre pessoas não podem ser ocultas. Elas são eminentemente visíveis. Os executivos que não se esforça para acertar em suas decisões sobre pessoas estão se arriscando a algo mais que o mau desempenho. Eles se arriscam a perder o respeito de suas organizações.


Entrevista à revista FORBES de dezembro de 2004.
Confinado a um andador e quase surdo, Drucker parou de dar entrevistas à imprensa desde o final de 2003. Em outubro de 2004, concedeu entrevista à revista FORBES, publicada em dezembro de 2004. Quem o entrevistou foi Rich Karlgaard, editor da Forbes. “Nós nos encontramos numa casa surpreendentemente espartana em Claremont, Califórnia, onde reside Peter Drucker” relata Karlgaard.
  
Veja a seguir alguns comentários de Drucker sobre liderança:
  
·        Líderes perguntam o que, de fato, tem que ser feito.
Líderes bem sucedidos não perguntam "O que quero fazer?" Eles perguntam: "O que precisa ser feito?" E, então, perguntam: “De todas as coisas que realmente fazem a diferença, o que, concretamente, eu sou capaz de fazer?”
Eles não se metem a fazer coisas que não sabem ou nas quais não são bons. Certificam-se das necessidades e das coisas a serem feitas, mas não por eles. Eles não têm medo da superioridade alheia. Andrew Carnegie queria ter como epitáfio em seu túmulo a seguinte frase: “Aqui jaz um homem que era capaz de atrair pessoas melhores que ele próprio para trabalhar”.
·        Selecione e faça as coisas importantes. 
Tenho visto um grande número de pessoas que são excepcionalmente boas como executivas, mas excepcionalmente pobres em escolher as coisas importantes. São magníficas em fazer coisas sem importância. Têm um currículo  impressionante de realizações triviais.
·        Evite as armadilhas da popularidade.
Os líderes têm foco em resultado. Sabem estabelecer uma missão. E uma outra coisa, eles sabem dizer “não”. A pressão sobre os líderes para que façam 984 coisas diferentes é simplesmente insustentável. Assim, os líderes eficazes sabem dizer “não” e manter esse “não”, apesar das pressões. Em conseqüência eles não se sufocam de tarefas. Muitos líderes tentam fazer um pedaço de 25 coisas diferentes e acabam sem fazer nada direito. Esses são os muito populares porque dizem sempre “sim”.

·        Aprenda a abandonar.
Uma pergunta crítica para líderes é, "Quando parar de colocar recursos em coisas que não estão dando certo?" As armadilhas mais perigosas para um líder são aqueles “quase-sucessos”, aquelas coisas que todos dizem que se você der mais um empurrãozinho você conseguirá o sucesso. Você tenta uma vez, tenta duas vezes, tenta uma terceira vez e não dá certo. Aí é a hora de abandonar o projeto, pois está claro que será difícil demais atingir o objetivo.
·        Tenha um escritório secreto.
Quando você é o executivo principal, você é um prisioneiro de sua organização. Quando você está no escritório, todo mundo vem até você para dizer ou pedir alguma coisa. E é inútil trancar a porta. Eles entrarão de um jeito ou de outro. Tenha um escritório secreto em outra parte, fora de sua empresa.
·        Como as organizações fracassam?
As organizações fracassam quando as pessoas têm que adivinhar no que o chefe está trabalhando e invariavelmente erram na adivinhação. Assim o Presidente tem que dizer: “O meu foco é este”. "Então o Presidente deve perguntar ao seu pessoal  "E você, qual é o seu foco? No que você está focando?” Deve perguntar "Por que você está colocando isso que está fazendo como prioridade?"
Certifique-se de que você sabe exatamente as prioridades e o foco de seus colaboradores e faça com que eles compreendam o seu foco. Em seguida, sente-se e coloque em uma ou duas folhas de papel, a seguinte nota: "Isto é o que eu entendi sobre o que nós discutimos esta tarde. Isto é o que eu penso que nós decidimos fazer. Isto é o que eu entendi que você se comprometeu a fazer dentro do prazo tal que discutimos”.
·        A transição de empreendedor para Presidente de uma grande companhia.
Novamente vamos começar por discutir o que não deve ser feito. Não pretenda ser o que você não é ou alguém que não seja você mesmo. Se você chegou até aqui é porque tem um estilo próprio de ser. É com o seu estilo que você tem que conseguir que as coisas sejam feitas. Não se meta em coisas que você não acredita e não queira fazer coisas que você não entende ou não seja competente para fazer. Aprenda dizer “não”. Os líderes eficazes mesclam as necessidades objetivas de sua companhia com as competências subjetivas que têm à sua disposição. Por isso é que eles conseguem fazer rapidamente um número muito grande de coisas bem feitas.
·        Como líderes competentes se arrebentam.
Um dos homens mais capazes com quem trabalhei, há muitos anos atrás, foi um chanceler democrático da Alemanha  pré-II Guerra Mundial, Heinrich Brüning. Ele teve uma habilidade incrível de ver o coração do problema da Alemanha na época. Mas era muito fraco em finanças. Ele deveria ter delegado aquelas tarefas para quem fosse competente em finanças, mas desperdiçou horas infinitas em orçamentos e executou-os mal. Esta foi uma falha terrível, especialmente num período de depressão econômica e essa falha ajudou a ascensão de Adolf Hitler. Nunca tente ser um perito se você não é. Reforce seus pontos fortes e encontre alguém competente para fazer as outras coisas que forem necessárias.
·        O carisma não tem o valor que se pretende dar.
Um dos presidentes americanos mais eficazes dos últimos 100 anos foi Harry Truman. Ele não tinha um grama de carisma. Truman era tão dócil que mais parecia um peixe ornamental. Mas todos que trabalhavam para ele o adoravam porque ele era totalmente confiável. Para ele, “não” era “não” e “sim”, era “sim” e nunca disse “não” para uma pessoa e “sim” para outra a respeito da mesma coisa. Outro presidente eficaz dos últimos 100 anos foi Ronald Reagan. Sua grande força não era o carisma, como geralmente se pensa, mas a sua exata e plena consciência e aceitação do que era capaz e do que não era capaz de fazer.


"Liderança é conversa fiada"

Em sua última e longa entrevista à imprensa americana, concedida à Rádio Pública Nacional, Peter Drucker - o mais respeitado pensador dos negócios, morto em novembro do ano passado, refletiu sobre os temas que consumiram a maior parte de sua existência de 95 anos. Discorreu sobre as vantagens da democracia, enveredou pelo futuro do capitalismo mundial e pela necessidade de haver equilíbrio entre os interesses de acionistas e consumidores.
Uma de suas declarações, porém, revelou-se particularmente surpreendente. Inquirido sobre a necessidade de as escolas de negócios formarem futuros líderes, afirmou não ser essa sua missão.
"Toda essa conversa sobre líderes é uma bobagem muito perigosa", disse. "É tudo conversa fiada." EXAME publica com exclusividade, os melhores trechos da entrevista:



Desde a publicação de seu livro "A Prática da Administração", há 50 anos, o senhor vem formando administradores. Qual seria sua mensagem fundamental para o homem de negócios do século 21?
Sempre faço três perguntas, não importa se o interlocutor representa uma empresa, igreja ou universidade. Também não importa se ele é americano, alemão ou japonês.
A primeira é: qual é o seu negócio? O que você está tentando fazer? O que o diferencia dos demais?
Segunda: qual a sua definição de resultado?
Terceira: quais são suas principais competências? E o que elas têm a ver com os resultados? É só isso. Não há diferença significativa entre o século atual e o último, exceto que hoje o número de empresas é muito maior.

Existem hoje inúmeras escolas de negócios incumbidas de formar novos líderes. Elas estão dando conta dessa tarefa?
É um erro afirmar que as escolas de negócios formam líderes. Sua tarefa consiste em formar medíocres competentes para que realizem um trabalho competente. Pode-se dizer o mesmo das faculdades de medicina. Sua função não é formar líderes, mas médicos que matem o menor número possível de pacientes. Permita-me dizer com toda a sinceridade: não acredito em líderes. Toda essa conversa sobre líderes é uma bobagem muito perigosa. É tudo conversa fiada. Entristece-me constatar que, encerrado o século 20, com líderes como Hitler, Stálin e Mao, as pessoas ainda estejam em busca de quem as comande, apesar de todo esse mau exemplo. Acho que tivemos carisma demais nos últimos 100 anos.

Já que o senhor se mostra tão cético em relação à liderança carismática, qual sua opinião sobre a atual era de presidentes de empresas estelares? O que o senhor pensa dos super salários pagos aos executivos americanos?

Tenho idade para me lembrar de Franklin Delano Roosevelt e de Harry Truman. Embora Roosevelt tenha sido um grande líder, Truman foi o melhor presidente que os Estados Unidos já tiveram, e o que mais fez pelo país. Ele não gostava de visibilidade. Ao contrário, todos achavam que ele não era grande coisa, inclusive ele mesmo. Portanto, não vejo muito sentido nessa história de super-CEOs. Quanto aos altos salários, acho que são escandalosos. JP Morgan, que não era de forma alguma avesso ao dinheiro, disse em 1906 que qualquer empresa onde o alto escalão ganhasse mais de 20 vezes o salário médio dos empregados não poderia ser bem administrada. Ele se recusava a investir nesse tipo de negócio. Essa é ainda uma regra útil.

Qual a sua avaliação do atual papel dos Estados Unidos no mundo?
Felizmente, já não somos mais os dominadores. Ainda dominamos do ponto de vista militar, mas não mais politicamente ou economicamente. Com a ascensão da China, da Índia e da União Européia, estamos nos tornando rapidamente apenas outra potência. E isso será difícil de aceitar, principalmente porque desfrutamos de 30 anos de ilusões de grandeza. Não porque fôssemos fortes, mas porque os outros eram fracos. Está surgindo uma economia mundial em que não somos nem sequer a potência principal. Esse lugar caberá, provavelmente, à União Européia.
Teremos de aprender a ser uma entre cerca de 12 nações importantes. O papel dos Estados Unidos no mundo será cada vez mais semelhante ao de outras nações.

Em 1993, o senhor escreveu "A Sociedade Pós-Capitalista". Seria possível explicar o significado do termo e quando chegaremos lá, se é que isso acontecerá algum dia?
A sociedade de hoje já é, em boa parte, pós-capitalista. Vivemos em uma sociedade da informação. Não há nada mais fácil do que ganhar dinheiro hoje em dia, contanto que você disponha da informação correta. Isso não acontecia no passado. Quem quer que tenha um computador pessoal, e não há quem não tenha um nos países desenvolvidos, tem acesso direto a todas as informações do mundo. Essas pessoas estão aprendendo a utilizá-las. Não me refiro à minha geração. Tenho 95 anos. Refiro-me à geração do meu neto. Nessa sociedade do conhecimento, a concorrência não se baseia no dinheiro que se tem, e sim na capacidade de tornar o conhecimento produtivo. Nós, americanos, por enquanto, estamos na dianteira desse processo. Mas não por muito tempo.

O senhor exprime grande confiança nos mercados livres, mas sempre teve reservas em relação ao capitalismo. Com o advento da sociedade do conhecimento, seus temores em relação a ele teriam se tornado irrelevantes?
Os mercados livres têm limitações severas, mas são infinitamente melhores do que qualquer alternativa, principalmente porque são muito rápidos em se corrigir. Quando cometem erros, e não são poucos, eles mesmos se corrigem. Uma economia, uma sociedade ou uma organização exigem que se agrade a gregos e troianos.
Uma das principais tarefas da administração consiste em equilibrar os resultados de curto prazo com os de longo prazo, em saber lidar com o mercado atual e com as inovações que vão surgindo. A administração tem como missão estabelecer o equilíbrio entre as diferentes expectativas das partes envolvidas. A primeira parte não é o acionista. É o consumidor. Se você não satisfizer o consumidor, nada mais resta a fazer. O capitalismo corre sempre o risco de pender para o lado do acionista. O trabalho da liderança consiste em restaurar o equilíbrio sempre que necessário, porque ele oscila.

Qual a sua opinião sobre o futuro do governo e o seu papel na sociedade pós-capitalista?
Uma das coisas que você aprende quando chega à minha idade é não fazer previsões. Vejo com ceticismo qualquer instituição que não imponha limitações e restrições severas ao poder.
Sou cético em relação ao poder. Não há mal político maior do que poder sem autoridade. O governo precisa se limitar, se restringir e se ater àquelas atividades que lhe são próprias. Há inúmeras coisas que o governo não pode fazer, porque seu desempenho é fraco. O governo existe para fixar normas. Quando ele se mete a fazer coisas, geralmente fracassa pela simples razão de que não consegue abrir mão delas facilmente. Ele se apega a elas e se recusa a largá-las, até levá-las ao desastre total, e ainda assim insiste em não soltá-las. Nos últimos 30 anos, reduzimos as funções do governo de modo que ele voltasse a fazer aquilo que faz bem, embora ainda hoje faça coisas demais.

Há muita inquietação em relação ao destino do mundo. Em que direção o senhor acha que ele está caminhando?
A crença no progresso que herdamos do século 18 não mais existe. A crença em um mundo dominado pela civilização ocidental está chegando ao fim. As potências emergentes – China e Índia - não são de forma alguma ocidentais, tampouco pretendem se ocidentalizar, como fez o Japão há 150 anos. Não compreendemos esse novo mundo. Não sabemos em que medida a União Européia será de fato uma união de países ou se continuará a ser uma vaga confederação de nações. Não sabemos em que direção caminha o Mercosul. Estamos em um período de transição tão crítico quanto o século 18 antes das guerras napoleônicas.
É tudo quanto sabemos. O mundo não será dominado por nenhuma outra grande potência. Muitos de nós ainda vivemos um mundo - o de 1960 - em que os Estados Unidos eram a única grande potência e a única economia que funcionava. Hoje a União Européia é maior. A China está tentando criar uma zona de livre comércio que será maior do que os Estados Unidos, tanto em termos de produção quanto de consumo. Teremos de aprender a conviver num mundo diferente e de valores diferentes. Nesse mundo, a informação - e não o poder - manterá o Ocidente coeso.

O senhor teve uma vida longa e refletiu muito sobre o modo de vivê-la. Agora, aos 95 anos, o que tem a dizer sobre a vida após a morte? Como o senhor vê esse momento de transição cada vez mais próximo?
Sou um cristão muito tradicional. Ponto final. Não penso nessas coisas. Disseram-me que não me cabe pensar nisso. Minha função é dizer apenas "sim, Senhor".

Portal revista EXAME   - 10.02.2006.

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