A CRISE NÃO É EUROPEIA. É MUNDIAL.

Nos últimos anos, mais precisamente de 2008 até 2012, a Europa vem sendo sacudida pela crise econômica que tem levado o nome do Continente, mas que também alguns denominam de "Grande Recessão", e que vem derrubando bolsas e governos desde então. Na verdade a crise não teve seu começo em 2008, visto ser bem mais antiga. 

Para George Soros (1), Presidente do Conselho da Soros Fund Management, a crise atual foi precipitada por uma "bolha" no mercado de residências e, em certos aspectos, é muito similar às crises que ocorreram desde a Segunda Guerra Mundial, em intervalos de 4 a 10 anos. Nos últimos 60 anos, cada vez que a expansão do crédito entrou em crise as autoridades financeiras agiram injetando liquidez no sistema financeiro e adotando medidas para estimular a economia. Isso criou um sistema de 'incentivos assimétricos', conhecido nos Estados Unidos como moral hazard. A super expansão (super-boom) saiu dos trilhos quando os instrumentos financeiros se tornaram tão complicados que as autoridades financeiras governamentais se tornaram tecnicamente incapazes de avaliar os riscos desses instrumentos financeiros, e passaram a se utilizar dos sistemas de gerenciamento de riscos dos próprios bancos privados. Da mesma maneira, as agências de análise de crédito internacionais se baseavam nas informações fornecidas pelos próprios criadores dos instrumentos sintéticos; às vésperas da quebra da Fannie Mae (2), essas agências ainda classificavam os derivativos de empréstimos subprime como um risco AAA. "Foi uma chocante abdicação de responsabilidade", classificou Soros. 

Do ano de 2008 até aqui todas pessoas têm acompanhado o caminhar dessa crise, assim como todos têm ficado apreensivos e amedrontados com as suas imprevisíveis consequências. O Presidente do Banco da Inglaterra, Sir Mervyn King, disse ao jornal inglês The Mail no domingo 12 de agosto de 2012, que "não há um final óbvio à vista". E que "se o resto do mundo estivesse crescendo normalmente, o reequilíbrio e a recuperação da nossa economia seria muito mais fácil". Em seguida, completou: "Mas não é. Mesmo a rápida expansão das economias emergentes está diminuindo e os problemas da área do euro continuam." 

Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha - que formam o chamado grupo dos PIIGS - são os que se encontram em posição mais delicada dentro da zona do euro, pois foram os que atuaram de forma mais indisciplinada nos gastos públicos e se endividaram excessivamente. Além de possuírem elevada relação dívida/PIB, estes países possuem pesados déficits orçamentários ante o tamanho de suas economias. Como não possuem sobras de recursos (superávit), entraram no radar da desconfiança dos investidores. 

O que ocorre é que o mundo inteiro, ou pelo menos os países mais ricos, possuem uma riqueza baseada na dívida. Em 1971 o Presidente Richard Nixon acabou com o lastro em ouro pois os EUA não tinham o metal suficiente para convertê-los em dólares. De lá pra cá, nada é real nas finanças de ninguém. Nem dos países, nem do trabalhador da pequena empresa que luta para cumprir com seus empréstimos bancários. 

No mesmo planeta em que tudo isso ocorre, na outra ponta tem-se a miséria – pobreza extrema e moderada. O Banco Mundial define a pobreza extrema como viver com menos de 1 dólar por dia, e pobreza moderada como viver com entre 1 e 2 dólares por dia. Estima-se que 1 bilhão e 100 milhões de pessoas a nível mundial tenham níveis de consumo inferiores a 1 dólar por dia e que 2 bilhões e 700 milhões tenham um nível inferior a 2 dólares. 

A pergunta a se fazer no momento não é o que fazer para solucionar a crise na Europa. A pergunta correta a se fazer é o que fazer com esses bilhões de pessoas no mundo que vivem em estado de pobreza? A solução, com certeza, não virá das pessoas pobres financeiramente. Mas também não virá daquelas que até hoje fizeram a economia de um planeta inteiro girar em torno de DÍVIDAS. Que fizeram com que os mais ricos acreditassem que o dinheiro (que não existe) fosse a fonte de todas as coisas. Fizeram com que a classe média acreditasse que trabalhar duro era o suficiente para conseguir o lugar ao sol. E fizeram com que os pobres trabalhassem infinitamente apenas na esperança de se manterem sobrevivendo. E finalmente, aos miseráveis, deram a certeza de que esperança é artigo de luxo para poucos do mundo. 

Na reportagem do Jornal “O Estadão” foi veiculada a informação de que os imigrantes ilegais serão rejeitados nos hospitais públicos na Espanha. O Governo anunciou que vai cortar 7 bilhões em gastos e que só residentes legalizados, que pagam impostos, terão saúde gratuita. Há 500 mil estrangeiros ilegais no país - 150 mil usaram os hospitais públicos no ano passado. Os miseráveis estão invadindo a Europa, os EUA e até mesmo países como o Brasil tido como emergente. Eles estão às portas, estão nas ruas tradicionais europeias mostrando que possuem rostos, que são pessoas e que como todas as demais necessitam trabalhar, comer, vestir e viver. 


A crise não é europeia, mas sim mundial. O poder financeiro, os ricos, a classe média, os pobres, todos vivem debaixo de uma DÍVIDA. Não aquela do sistema financeiro que hoje está em colapso. Mas a dívida mundial, a dívida consigo mesmo, com o humano. Não adianta trancar as portas de casa ou as fronteiras. Os miseráveis entrarão. Farão isso pois não são culpados pela falência dos ricos. Estes se perderam sozinhos em suas próprias criações. Esqueceram-se que a riqueza está no trabalho das pessoas, na capacidade mental do ser humano de criar, transformar e progredir. Ao esquecerem-se de parte do planeta que vive na miséria, esqueceram da maior fonte de riqueza que a Terra pode produzir. Somente o ser humano é capaz de descobrir a cura de doenças, criar fórmulas matemáticas, inventar artefatos e fazer o mundo girar. E quem faz tudo isso não é o dinheiro. Todos os dias em lugares pobres do mundo morre um gênio, um médico em potencial, um cérebro criado para a física, biologia, música e poesia. Dinheiro não faz isso. 

Para Hazel Henderson (3), uma eventual solução para o mundo está no “onde só se ganha”. Para ela, todo o sistema mundial tornou-se obsoleto. “Os seres humanos competem predominantemente para maximizar seus próprios interesses individuais”. “Que o livre comércio sempre é do interesse de alguém (porque parece baixar os preços aos consumidores, mas na verdade esses preços deixam de incluir custos sociais e ambientais completos)”. Para Hazel Henderson a esperança para o futuro do planeta reside na evolução rápida da sociedade civil mundial e no aumento da colaboração entre as Nações Unidas, os negócios e os globalistas populares. Consequentemente, agora temos a possibilidade de escolher um mundo onde só se ganha.” 

O grande volume de pessoas está na sociedade civil, e mesmo que esta nem sempre detenha o poder financeiro, a conscientização de que mais do que poder é necessário fazer, pode levar a uma solução onde todos ganhem. 

O ser humano sempre foi o melhor investimento. 



Raquel Michelline

(1) George Soros, nascido em Budapeste é um empresário e homem de negócios húngaro-americano. Ficou famoso pelas suas atividades enquanto especulador, nomeadamente em matéria de taxas de câmbio, chegando a ganhar 1 bilhão de dólares em um único dia apostando contra o banco da Inglaterra. 
(2) A Federal National Mortgage Association (FNMA), era uma empresa de capital aberto, garantida pelo governo dos Estados Unidos e autorizada a conceder e garantir empréstimos. 
(3) Hazel Henderson é analista política de desenvolvimento internacional. 

Fontes: 
Jornal inglês The Mail - 13 de agosto de 2012
O novo negócio dos negócios – Wold Business Academy 
Revista Veja - Maio de 2010

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